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A Tribuna - Saulo Andrade (15/12/2023)

RJ é o segundo estado que mais aderiu ao Desenrola Brasil

Prorrogado para o final de março, programa atendeu 10,7 milhões de brasileiros e renegociou R$ 29 bi em dívidas

Uma conta, numa agência bancária de uma grande instituição, e o início de uma dívida, no cartão de crédito. Até aí, "tudo bem". Acontece. Num determinado momento, chega a péssima notícia: você perdeu o direito de receber um dinheiro que era tido como "certo", como uma pensão de família, que o ajudava bastante, e aquele endividamento - que já era grande - aumenta. Esta é a história de Marcos Joaquim - nome fictício de um personagem da vida real.

"Fui deixando os cartões de lado. Isso foi acumulando, gerando uma bola de neve. Uma conta, que era de menos de R$ 1 mil, transformou-se em algo de mais de R$ 7 mil", relata o maqueiro de Niterói, que está esperando um filho e vem tentando sanar suas dívidas, aos poucos.

Esta é apenas uma das muitas histórias de compatriotas que, com o passar dos anos, e, devido ao fato de terem uma renda média mensal baixa - com uma série de obrigações fixas a pagar , endividaram-se, com o passar do tempo.

Inaugurado em outubro último, o programa Desenrola Brasil, do governo federal, pode fazer com que a população endividada possa voltar a fazer crédito e consumir novamente - reativando a economia -, na medida em que equacionem suas dívidas. O desconto dado faz com que os juros sejam eliminados, dependendo do processo de negociação. Em alguns casos, há abatimentos que chegam a até 90% do valor da dívida.

Prorrogado para 31 de março, sem exigir que o cidadão tenha a versão "prata" ou "ouro" da plataforma Gov.BR, os usuários da faixa inicial - "bronze" - agora também podem, desde a última segunda-feira (11), acessar o programa. Em média, a pessoa endividada consegue renegociar sua dívida em aproximadamente quatro minutos.

De acordo com o último censo nacional do Desenrola, consolidado no último dia 6 de dezembro, com 111.541 cidadãos (11%), o estado do Rio de Janeiro é o segundo com mais CPFs, tentando renegociar dívidas. Está atrás de São Paulo, com 244.044 (24%) e antes de Minas Gerais, com 80.255 (8%). No total, o programa atendeu 10,7 milhões de brasileiros e renegociou R$ 29 bi em dívidas.

O economista Adhemar Mineiro (UFRJ) avalia que, no nosso estado, há a expectativa de se atingir mais endividados, até o fim da extensão do programa, em março. Ele afirma que a raiz do endividamento das famílias possui três causas: há pessoas que não têm educação financeira e perdem a referência, ao se endividarem. Há ainda aquelas que tinham uma fonte de renda e deixam de contar com esse dinheiro. Fora a questão das taxas de juros, "muito altas", no país.

"Provavelmente, por exemplo, durante a pandemia, muitos acabaram se endividando. Eram pessoas que, de alguma forma, prestavam serviços e deixaram de fazê-los, perdendo suas fontes de renda. Fora o fato de muita gente não ter muito controle sobre as taxas de juros. Elas pegam dívidas a juros flutuantes e, quando a taxa sobe, vira uma bola de neve. A combinação de todos os fatores de endividamento citados torna o problema mais grave", ressalta o especialista.

Na opinião do economista Gilberto Braga (Ibmec-Rio), o Desenrola é um programa que tem o potencial de reativar a economia das cidades e do estado. Ele também recorda que, nos últimos anos, o Brasil vivenciou uma inflação "muito elevada", que chegou a 12% ao ano. Outro fator de endividamento, segundo ele, foi a pandemia: fez com que muitos trabalhadores, principalmente os de baixa renda, perdessem seus empregos e, por receberem salários menores, ficassem indefesos, em relação ao poder aquisitivo e ao reajuste generalizado dos preços.

"Quando o dinheiro deixa de dar para pagar as contas, a primeira consequência natural que as famílias adotam é fazer o endividamento: usar o cartão de crédito, o limite do banco, no cheque especial. A partir de um determinado ponto, muitas delas perdem o controle e essas dívidas se tornam impagáveis, pela própria rolagem dos juros sobre juros, no saldo devedor", exemplificou.


Números

Em operação desde seu lançamento, em julho, o programa Desenrola Brasil já contabiliza 10,7 milhões de brasileiros atendidos e um valor de R$ 29 bilhões em dívidas renegociadas. A Fase 2, aberta em outubro, envolvendo a renegociação de dívidas bancárias e não bancárias (como contas de luz, água, varejo e educação), contou com descontos de até 98,6% do valor originalmente devido (caso de um débito que caiu de R$ 835,02 para R$ 10,91). Os dados são do "Censo Nacional do Programa Desenrola Brasil", divulgado no último dia 6 de dezembro, pelo Ministério da Fazenda e pela Bolsa de Valores do Brasil (B3), em entrevista coletiva em Brasília.


Perfil

A mais recente pesquisa do Datafolha, concluída em 6 de dezembro último, revela perfis de endividamento como "carnê de loja", "empréstimo em banco" e "financiamento de veículos". Em relação ao item "cartão de crédito", 56% da população o utiliza; 10% está com ele em atraso; 46% está em dia e 44% não possui cartão.

21% possui limite de cheque especial; 2% está com ele em atraso; 18%, em dia e 79% não tem limite no cheque especial.

Foram realizadas, no total, 2.004 entrevistas, em 135 municípios de todo o Brasil.